MOSAICOS DE UMA VIDA

Juntando cada peça forma-se o mosaico de minha vida. Tantos sentimentos me envolvem. Sentimentos ruins, outros bons. Saudade de quem se foi para eternidade. Saudade de quem posso ligar para ouvir a voz. Tristeza pelas metas não cumpridas e alegria pelos objetivos alcançados. Gemidos de dor, outros de prazer.

10 de mai. de 2010

Histórias do Caminho - 5


Durante o Caminho de Santiago as paradas necessárias eram breves uma vez que não ficamos em albergues, mas sim em pousadas e afins previamente agendadas. Há quem diga que peregrino de verdade deve ficar em albergue, participar da ceia coletiva, dividir o quarto com várias pessoas desconhecidas, aventurar vaga em albergue e caso não consiga é necessário caminhar até o próximo povoado, enfim...

Nós não nos importamos com as críticas. Afinal, ter um local acolhedor, ter privacidade e dormir com um mínimo de conforto era merecedor depois de uma caminhada diária de 30 km. Vale salientar que poderíamos fazer em menos quilômetros, mas teríamos que passar mais dias no Caminho. Não tínhamos tempo suficiente devido nossos compromissos que só foram esquecidos durante a peregrinação.

Em alguns momentos de silencio e reflexão nos perguntávamos por que estávamos fazendo a peregrinação. Eu pelo menos não tinha resposta. Minha irmã me perguntava se eu faria novamente. Sinceramente, não que eu tenha me arrependido, só faria novamente com mais dias disponíveis. Acredito que com menos quilômetros por dia as dores não seriam tantas e tão intensas. E as paisagens que deixei de apreciar e fotografar com certeza seriam vistas com outros olhos.

Mesmo com dores e cansaço as paradas para descanso e as paradas noturnas eram regadas de uma cervejinha ou claro, um vinho para esquentar.


Quando me perguntam se mudei alguma coisa com a peregrinação, se houve algum encontro espiritual, algo transcendental, eu respondo que não fui para mudar nada, mas sim para enfatizar o meu EU, elevar ainda mais minha auto-estima. Se isso é mudar, então mudei!

E para os que dizem que não fomos peregrinas autenticas eu só tenho a dizer que cumprimos nossa meta, realizamos nosso sonho e para comemorar nossa felicidade em Santiago nos deliciamos com a culinária local.

6 de mai. de 2010

Histórias do Caminho - 4


É praticamente impossível fazer o Caminho de Santiago de Compostela e concluí-lo sem sentir dor. Meu preparo físico meses antes de começar a peregrinação estava limitado à uma hora de caminhada por dia num parque com superfície plana. Já durante o Caminho de Santiago existia lama, pedra, muitas subidas; isso tudo eu já esperava, mas não levei em consideração que não seria apenas uma hora de caminhada ou poucos quilômetros. Caminhávamos de 15 km a 30 km por dia.

Já me disseram que era impossível concluir o Caminho sem bolhas nos pés. Isso nós conseguimos. Para tanto, os cuidados necessários não foram esquecidos. Meias grossas, bota confortável e previamente amaciada, cremes e a qualquer sinal de desconforto era preciso parar e verificar o problema antes de prosseguir.
 


Mesmo com tantos cuidados minha irmã machucou o pé, sendo preciso caminhar alguns trechos de sandálias e as botas ficaram penduradas na mochila. Para ela as descidas doíam os pés e as subidas para mim desencadeavam crise asmática. Por isso, inicialmente ela torcia pelas subidas e eu pelas descidas, mas nosso instinto mudou nossos desejos.

Como forma de preocupação, cuidado e solidariedade passei a desejar as subidas e ela as descidas. E nessa sintonia seguíamos rumo à Santiago.

Histórias do Caminho - 3


Ao longo do Caminho de Santiago de Compostela existem alguns pontos de apoio para descanso, alojamentos, albergues, lugares para refeição, uso do sanitário, ou simplesmente para carimbar a Credencial de Peregrino. Afinal, este documento comprova a peregrinação e deverá ser apresentada em Santiago.

Logo na primeira parada conhecemos Maria, uma coereana estudante de teologia e que já estava no Caminho há seis dias. Como lembrança Maria deixou num papel meu nome e apelido escrito em seu idioma. Depois seguiu rumo a Santiago em passos rápidos.

Algo bastante curioso me chamou atenção durante a peregrinação no Caminho de Santiago. Era possível encontrar muitos objetos deixados pra trás pelos peregrinos. 



O cansaço e as dores traziam a necessidade de se desfazer do excesso de bagagem; por isso casacos, luvas, garrafa-térmica, botas, capa de chuva, e até mesmo sacolas com lanches e água foram abandonados. Resumindo, durante o caminho é possível ver o desapego às coisas materiais. 

A cada parada tínhamos contato breve com outros peregrinos de diversas partes do mundo. Alguns sozinhos, outros em grandes ou pequenos grupos. Na maioria das vezes o único contato era o desejo de bom caminho. Vários peregrinos ou nativos nos cumprimentam expressando esse desejo.  A frase foi ouvida inúmeras vezes, em diversos sotaques, mas sempre em espanhol: BUEN CAMIÑO.

5 de mai. de 2010

Histórias do Caminho - 2


Para se obter a Compostelana (certificado que comprova a realização do Caminho de Santiago de Compostela) é necessário caminhar no mínimo os últimos 100 km do Caminho de Santiago. Sendo assim, no dia 05/04/10 iniciamos o caminho propriamente dito a partir de Sarria há 114 km de Santiago. A saída foi pouco animadora diante do frio que estava fazendo. Mesmo com o sol brilhando e céu azul, a temperatura era de 13°C; para mim que estava saindo de uma temperatura mínima no Recife de 30°C foi necessário usar duas calças e duas blusas.

As belas paisagens com riachos, montanhas, pedras, correntezas d’água e  fontes de água, provocavam-me euforia e felicidade por tamanha beleza numa oportunidade sui generis.


Todo o Caminho é sinalizado com uma seta geralmente amarela, uma concha e desenho de um peregrino. Não tem como se perder. Tudo me deixava deslumbrada e era motivo para uma paradinha básica apenas para um clik. No início, ainda não tinha idéia do que me esperava mais adiante, então fotografias não faltaram. 


Porém, nem todo caminho foi tão maravilhoso. Umas três horas depois do inicio comecei a sentir um pouco de calor e forte cansaço, não apenas físico, mas principalmente asmático.Enfretamos escadarias, pedras, lamas, além das mochilas e por isso o final deste primeiro dia foi marcado por muitas dores. Dores que começaram na virilha, depois nas costas e se somaram às outras dores. 



Enfim, eu só desejava chegar ao nosso destino (daquele dia) e descansar, dormir. Por algum momento pensei que não conseguiria prosseguir no dia seguinte. As dores eram tão intensas que as belas paisagens deixaram de ser fotografadas; foram apenas apreciadas e permanecem muito forte em minhas lembranças.

Histórias do Caminho - 1

Logo no primeiro dia do Caminho de Santiago em 05/04/10 aconteceu um fato a priori assustador, mas tudo acabou em risadas. Já era início de noite, o sol ainda brilhava e o cansaço e dores imperavam.

Estávamos loucas para chegar ao nosso local de parada e descanso, porém com tanta dor na virilha não era possível fazer muito esforço.Os passos lentos e desanimadores cessaram quando chegamos num local tipo um bosque. Árvores muito próximas umas das outras e bastante altas tornavam o ambiente escuro. Uma placa sinalizava “peligro – gravillas sueltas”.
Sorriso de dor antes de ler a placa de perigo
Sem saber o que seria gravillas começamos a andar rápido, quase correndo e procurando algum lugar onde pudéssemos nos esconder caso a tal da gravilla aparecesse. Imaginamos que podia ser veado ou mesmo um bicho tipo monstro da Tanzânia.

Por fim passou o “perigo” e logo depois ficamos sabemos que na língua galega (falada na Galícia) gravillas significa cascalhinhos ou pequenas britas/pedras pequenas. Sendo assim, deveríamos andar com cuidado pra não cair, só que fizemos exatamente o contrário.

4 de mai. de 2010

Contratempos - Caminho de Santiago

Faltando uns 15 dias para minha viagem rumo ao Caminho de Santiago peguei conjuntivite. No dia da viagem os olhos ainda estavam inchados. Por orientação do oftalmologista era necessário continuar colocando colírio a cada duas horas. Meu colírio acabou sendo descartado no aeroporto do Recife porque não estava acondicionado em saco plástico zipado.

Com esse contratempo acabei me atrasando. Só me toquei quando fui anunciada para comparecer ao portão de embarque (ultima chamada). Ai meu Deus... Sai correndo desesperada acompanhada de um funcionário que passava pelo rádio a informação de que eu já estava a caminho.

Já acomodada dentro do avião e indignada por estar sem meu colírio outro fato começou a me atormentar. Um menino aparentando uns três anos, super inquieto e não parava de gritar: VAI AVIÃO, QUE DEMORA. VOA DANADO!

O pai e os passageiros achavam a maior graça. Quando o avião começou a decolar o menino se animou todo e gritava ainda mais alto: COMEÇOU A SUBIR. SOBE AVIÃO. SUBIU ESSE DANADO.

Mais risos da platéia. E eu imaginando como seria minha viagem sentada ao lado daquele menino. De repente ele começa a gritar: AGORA SE PREPARAR PARA CAIR. CAI AVIAO DANADO.

Ninguém riu. Só eu aqui por dentro kkkkkkkkkkkkk O pai ficou nervoso, brigou com o filho fazendo-o calar. Comecei a ouvir frases de alguns passageiros. Coisa do tipo: Cuida de nós, senhor. Deus está conosco. Amém.

Bom, tudo ficou quieto, menino calado e todos na paz até a conexão. Quando o menino já estava saindo do avião virou para quem ainda estava dentro e gritou: VAO FICAR PRESOS AI DENTRO, ESSES DANADOS.

Risos da platéia e do pai abestalhado e alívio pra mim por não ter que seguir viagem com aquele menino danado.

3 de mai. de 2010

Bota - Caminho de Santiago


Bota timberland
Um ponto importante para o sucesso no Caminho de Santiago é a escolha da bota ou tênis. Eu optei por uma bota própria para pisos inconstantes (plano, declinado, seco, molhado). Comecei a usá-la um mês antes para amaciamento e adaptação nos pés.

 
Precaução - Caminho de Santiago


Durante o Caminho usei meias grossas e por medida de precaução coloquei curativo tipo band aid nos pontos onde poderia formar bolhas. Terminei o caminho sem nenhum problema nos pés.

2 de mai. de 2010

Credencial de Peregrina

Para mim os primeiros passos do Caminho de Santiago tiveram início quando tomei a decisão de fazê-lo. Essa decisão foi seguida do corre-corre para planejamento, providências e tudo que fosse necessário para a viagem.

Minha Credencial de Peregrina
Uma das providências foi à aquisição da Credencial de Peregrino na Associação Amigos do Caminho de Santiago. Neste dia, ao me dirigir para o elevador onde está situada a Associação um “cidadão” me mandou usar o elevador de serviços e não o social. Ele incorporou essa forma de conceituar as pessoas, forma adquirida em sociedade, seja por sua cor, seja pela altura do seu salto ou mesmo pelo seu traje esporte ou fino. Quanto a mim, cheguei ao meu crescimento pessoal. Por isso, limitei-me a dizer: é exatamente pelo social que devo ir.

1 de mai. de 2010

PEREGRINAÇÕES: Ser mãe e Caminho de Santiago

No início de 2010 pensei na possibilidade de fazer o Caminho de Santiago de Compostela. Dessa vez nada de adiar gravidez. Continuei os treinos, mas confesso que lá no fundo torcia para não engravidar antes dessa segunda viagem para Espanha. A primeira viagem teve um caráter mais turístico e essa tinha um sentido diferente. Precisava de algo tranqüilo, nada de poluição, muito menos agitação. Era preciso esquecer tudo e todos, incluindo trabalho, estudo, comida pra fazer, roupa pra lavar e casa para arrumar. Precisava de um momento meu, no qual pudesse pensar mais em mim, nos próximos passos que daria.

A decisão final de fazer o Caminho de Santiago aconteceu em fevereiro. Comprei as passagens e viajei em Abril; um mês depois de entregar os trabalhos de conclusão de curso da pós-graduação. Parecia um sonho! Foi divino!